segunda-feira, 27 de abril de 2020

COVID-19 e úlcera plantar em diabéticos



Uma vez considerada uma pandemia pela Organização Mundial de Saúde, o que o novo coronavírus significará para os milhões de pacientes diabéticos pelo mundo?

Instituições científicas são unânimes em afirmar enfaticamente que os portadores de DM (Diabetes Mellitus) são os mais vulneráveis às complicações da COVID-19. Ou seja, o risco de óbito é maior entre os diabéticos acometidos pela nova doença.

O diabetes foi responsável por aproximadamente 20% das admissões em unidade de terapia intensiva (UTI) de acordo com uma análise recente em Wuhan, China.(1)

Dados mais recentes, desta feita da Itália, revelaram que mais de dois terços das pessoas que morreram por COVID-19 tinham diabetes. (2)

Além disso o Diabetes foi inquestionavelmente um importante fator para a gravidade e a mortalidade de surtos anteriores de viroses evoluindo com Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS). (3)

O que dizer, então, dos diabéticos que são também portadores de feridas ou úlceras plantares?

Precisamos considerar duas observações que parecem estar se tornando relevantes para que se possam tirar conclusões que respondam a essa pergunta:

1.     Primeira observação: O aumento dos níveis de citocinas parece desempenhar importante papel na evolução desfavorável dos contaminados pela COVID-19. Na mídia especializada estão se tornando frequentes expressões como “tempestade hiper inflamatória” e “tempestade citocínica” na SARS (Severe Acute Respiratory Syndrome / Síndrome Respiratória Aguda Grave) associada ao novo coronavirus. Esse fenômeno, revelador do poderoso componente inflamatório tecidual da doença, também estava presente em surtos globais anteriores tais como a “gripe espanhola” e outras epidemias.
2.     Segunda observação: Estudos vem mostrando que os diabéticos portadores de úlceras plantares já desenvolvem alterações e aumento dessas citocinas inflamatórias. Esse aumento das citocinas pro-inflamatórias também está presente na neuropatia do diabético que desenvolve a osteoartropatia de Charcot.
Portanto, mesmo sendo até o momento algo hipotético, podemos desconfiar que essa “tempestade das citocinas” possa significar um incremento no risco para essa população específica de pacientes. Ou seja nos dois eventos - COVID-19 e úlcera em pé diabético - ocorrem alterações nos níveis de citocinas que denunciam uma explosiva atividade inflamatória.
Obviamente, na ausência ainda de fundamentos e critérios científicos, podemos apenas concluir que os cuidados devem ser redobrados e as observações clínicas bem documentadas para que possam ser identificadas eventuais correlações entre essas duas situações mórbidas.
De resto, aguardar o avanço das investigações científicas.

Leituras recomendadas:

1.     1. Zhou F, Yu T, Du R, Fan G, Liu Y, Liu Z, Xiang J, Wang Y, Song B, Gu X, Guan L, Wei Y, Li H, Wu X, Xu J, Tu S, Zhang Y, Chen H, Cao B. Clinical course and risk factors for mortality of adult inpatients with COVID-19 in Wuhan, China: a retrospective cohort study. The Lancet 2020. https://doi.org/10.1016/S0140- 6736(20)30566-3
2.     Remuzzi A, Remuzzi G. COVID-19 and Italy: what next?. The Lancet 2020
3.     Memish ZA, Perlman S, Van Kerkhove MD, Zumla A. Middle East respiratory syndrome. The Lancet 2020

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Vitamina D e cicatrização

A vitamina D é uma vitamina lipossolúvel que não é comumente encontrada em alimentos e existe em configurações diferentes. Boas fontes de vitamina D são cereais enriquecidos, leite enriquecido e peixe rico em lipídios tal como o salmão. 


Estes nutrientes também são produzidos de forma endógena pela exposição da pele aos raios ultravioleta do sol. 

A vitamina D, quando disponibilizada ao organismo através da exposição solar, alimentos e suplementos alimentares, é organicamente inativa e deve ser submetida a um processo químico que introduza um grupo hidroxilo ( -OH) em um composto orgânico (hidroxilação). 

Este processo químico converte a vitamina D em calcidiol (ou calcifediol) e calcitriol que o corpo pode absorver.

A Vitamina D no organismo


A vitamina D é necessária ao organismo para promover a absorção de cálcio, o crescimento e o metabolismo ósseos. 

Baixos níveis de vitamina D estão associados a muitas enfermidades crônicas e condições inflamatórias, bem como um aumento do risco de mortalidade. 

A carência ou deficiência de vitamina D está associada aos cânceres mais comuns, doenças autoimunes, doenças infecciosas e doenças cardiovasculares. A deficiência causa raquitismo em crianças e osteomalácia em adultos . 

Em combinação com o cálcio, a vitamina D ajuda a prevenir a osteoporose em idosos. 

A vitamina D tem receptores em quase todas as células do corpo.
Além de promover ossos saudáveis, a vitamina D está envolvida em outros processos orgânicos, como a modulação do crescimento celular, a função imunológica, a redução da inflamação e a atividade neuromuscular. 

Mais de 200 genes, incluindo aqueles envolvidos na proliferação celular, na diferenciação celular, na angiogênese e apoptose, precisam da vitamina D.


 A vitamina D é essencial para a regulação de células em vários tecidos, incluindo os queratinócitos da epiderme. Funciona modificando fatores de crescimento e citocinas. A vitamina D pode influenciar a cicatrização, aumentando a produção de fatores de crescimento epidérmico e plaquetário.

Ingestão nutricional recomendada


O Conselho de Alimentação e Nutrição da Academia Nacional de Medicina dos Estados Unidos define o limite de ingestão recomendado de vitamina D com base na ingestão diária necessária para uma boa saúde óssea e um metabolismo de cálcio adequado para um adulto saudável.Esse aporte recomendado é de 400 unidades internacionais (UI) para crianças até 12 meses, 600 UI entre 1 e 70 anos de idade e 800 UI após 70 anos.

Vitamina D e cicatrização


A exposição solar insuficiente e as doença crônica levam à deficiência de vitamina D em pacientes de todas as idades. A carência de vitamina D, definida como inferior a 20 ng / ml, e sua deficiência, com níveis entre 20 e 30 ng / ml, afetam aproximadamente 1 bilhão de pessoas em todo o mundo.

Recentemente demonstrou-se que a vitamina D é benéfica em várias doenças vasculares, pois promove a angiogênese e inibe a resposta inflamatória. 

Um estudo que analisou o papel da vitamina D na cicatrização da pele em camundongos diabéticos induzidos por estreptozotocina concluiu que os suplementos de vitamina D podem acelerar significativamente a taxa de cicatrização.


Razzaghi e colegas examinaram os efeitos dos suplementos de vitamina D na cicatrização de feridas e no estado metabólico em pessoas com pé diabético.

O estudo concluiu que os suplementos de vitamina D têm um efeito positivo na estabilização dos níveis sanguíneos. glicose e colesterol. Relatou também que a vitamina D pode ter um efeito colateral na cicatrização de feridas dada a melhora no status de controle glicêmico observada nos indivíduos estudados. 

Após a verificação da relação entre vitamina D e úlcera por pressão em pacientes residentes da comunidade idosa, Kalava and Associates concluíram que a deficiência de vitamina D não era um fator de risco independente para o desenvolvimento de úlceras por pressão.

Implicações na prática


Embora a relação entre a administração de suplementos de vitamina D e a cicatrização de feridas não tenha sido claramente estabelecida, sabemos que esse nutriente é essencial para a manutenção de ossos saudáveis. A carência e deficiência de vitamina D são muito comuns e podem ter um impacto negativo na saúde e bem-estar.

É fácil lutar contra a deficiência de vitamina D, não custa muito e parece ter muitos benefícios para a saúde.


Leituras sobre o tema:

1. Office of Dietary Supplements, National Institutes of Health. Vitamin D: Fact Sheet for Health Professionals. 2017. https://ods.od.nih.gov/factsheets/VitaminD-HealthProfessional/. Accessed September 21, 2018.
2. Regulski M. Addressing vitamin D in the wound clinic. Today's Wound Clinic. 2016;10(11). https://www.todayswoundclinic.com/articles/addressing-vitamin-d-deficien.... Accessed September 22, 2018.
3. Institute of Medicine Food and Nutrition Board. Dietary Reference Intakes for Calcium and Vitamin D. Washington, DC: National Academy Press; 2010.
4. Guo S, DiPietro LA. Factors affecting wound healing. J Dent Res. 2010;89(3):219–29. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2903966/. Accessed September 21, 2018.
5. Holick MF. Vitamin D deficiency. N Engl J Med. 2007;357(3):266–81. https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMra070553. Accessed September 21, 2018.
6. Yuan Y, Das SK, Li M. Vitamin D ameliorates impaired wound healing in streptozotocin-induced diabetic mice by suppressing NF-κB-mediated inflammatory genes. Biosci Rep. 2018;38(2):BSR20171294. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5835716/. Accessed September 22, 2018.
7. Razzaghi R, Pourbagheri H, Momen-Heravi M, et al. The effects of vitamin D supplementation on wound healing and metabolic status in patients with diabetic foot ulcer: a randomized, double-blind, placebo-controlled trial. J Diabetes Complications. 2017;31(4):766–72.
8. Kalava UR, Cha SS, Takahashi PY. Association between vitamin D and pressure ulcers in older ambulatory adults: results of a matched case–control study. Clin Interv Aging. 2011;6:213–9. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21966215. Accessed 9/21/18.


Fonte: https://www.e-pansement.fr/actualites/existe-t-il-une-relation-entre-vitamine-d-et-cicatrisation

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

Feridas arteriais dos membros inferiores

A diminuição do fluxo arterial para os membros inferiores pode contribuir para a formação de feridas que recebem a denominação de feridas ou úlceras isquêmicas.

Sabemos que a passagem do sangue diminui, parcial ou totalmente, quando placas de gordura vão se formando (ao longo da vida) e provocam o estreitamento ou o entupimento das artérias.
Úlcera isquêmica - face medial
do tornozelo





Em consequência os tecidos vão receber uma quantidade menor de oxigênio e de nutrientes que, aos poucos, vai provocando a morte desses tecidos que se manifesta pela formação de feridas ou úlceras. A esse menor aporte de oxigênio dá-se o nome de isquemia: isquemia cerebral, isquemia renal, isquemia intestinal ou mesentérica, isquemia dos membros inferiores, etc.
Úlcera isquêmica - dorso do pé




Características

  • As úlceras isquêmicas se formam, regra geral, na porção final das pernas ou em alguma região dos pés. 
  • Os pontos de pressão da região plantar provocados ao andar ou locais de atrito com calçados inapropriados também são localizações onde podem se formar feridas isquêmicas.
  • Não costumam ser muito extensas; são mais arredondadas e mais fundas do que as úlceras venosas ou varicosas.


  • O leito costuma ser escuro ou amarelado e com tecidos mortos ou desvitalizados. Muitas vezes o leito está coberto por uma casca negra (escara).
  • A perna onde se localiza a ferida costuma estar mais fria do que a perna normal.
  • Os pulsos estão ausentes ou muito difíceis de palpar.
  • O bom examinador verificará que os pelos das pernas são raros e as unhas se apresentam atróficas e deformadas.
  • Outra característica das úlceras isquêmicas é o componente DOR. Frequentemente é o sintoma que faz o paciente procurar atendimento médico. A intensa dor se manifesta especialmente ao caminhar e durante o repouso noturno.
  • Na grande maioria dos casos são feridas secas e com pouca secreção.
  • Os diabéticos apresentam maior predisposição para o desenvolvimento de feridas isquêmicas dos membros inferiores.

Úlcera isquêmica em pé diabético meses
após amputação do 4º dedo

Causas e fatores de risco


A aterosclerose - endurecimento das artérias decorrente da deposição de gorduras, colesterol e outras substâncias em suas paredes - é a causa predominante na formação da isquemia dos membros inferiores.




Além disso temos também os seguintes fatores de risco:
        • diabetes
        • sedentarismo
        • obesidade
        • dislipidemia
        • tabagismo
        • hipertensão

Como diagnosticar

Um detalhado e sistemático exame físico feito pelo médico é a mais importante ferramenta para um correto diagnóstico. A avaliação negligente do paciente arterial pode levar a consequências dramáticas, sendo as amputações o desfecho mais frequente e que poderiam ser evitados.

Alguns exames oferecem importantes informações auxiliares e complementares, tais como:
    • estudo com Doppler em suas diferentes modalidades
    • medidas do IPTB - Índice de Pressão Tornozelo/Braço
    • medida de oxigenação transcutânea
    • pressão sistólica absoluta distal e dos dedos
    • Angiotomografia e Angiorressonância

quinta-feira, 20 de julho de 2017

Palmilhas artesanais para mal perfurante

O mal perfurante plantar em pé de diabéticos com neuropatia desafia a prática médica.

A exigência de calçados apropriados ao problema e que auxiliam no processo de cicatrização é o “xis” da questão. São calçados elaborados para neutralizar os pontos de pressão que provocam micro traumas repetidos por tempo prolongado e evoluem para a formação das feridas.

O ambiente neuropático, com perda da sensibilidade, faz com que o paciente não se dê conta do que está acontecendo. Resultado provável, quando providências adequadas não forem adotadas: infecção, necrose, osteomielite e amputações nos mais diferentes níveis. Uma tragédia.

Na prática, o paciente teria que evitar pisar sobre a ferida do pé afetado. Só que isto o impossibilita para atividades laborativas e dificulta sua vida social.

Por outro lado, os calçados apropriados são de custo inacessível para a maioria dos nossos pacientes.

Quase sempre esses calçados devem ser feitos sob encomenda. Precisam ter uma altura/profundidade que possibilitem a inclusão de palmilhas sem criar um ambiente constrictivo que resulte em traumas pelo uso continuado. Qual o problema? O custo!

Os dispositivos de contato total (tipo TCC) produzem um resultado positivo indiscutível nos casos bem indicados. Trata-se de sistemas que precisam ser trocados pelo menos uma vez por semana. Qual o problema? O custo!

Pesquisas já existem para a fabricação de “palmilhas inteligentes” tais como a mostrada na figura abaixo, com capacidade de identificar e acomodar os pontos de alta pressão na base plantar. Ainda não estão disponíveis. Mas, quando estiverem, qual será o problema? O custo!












Na busca de alternativas estamos obtendo resultados interessantes e promissores com a confecção artesanal de palmilhas a partir de sandálias usadas pelos próprios pacientes. Exige um pouco de paciência, criatividade, adesão colaborativa e a parceria de seus familiares.

Não há nada de novo no que diz respeito aos objetivos: reduzir a carga e seus efeitos sobre a localização das feridas quando o paciente deambula. Algumas empresas já comercializam produtos com essa característica. Mostramos abaixo dois exemplos:




        Palmilha comercializada pela DARCO INTERNATIONAL em cuja base estão implantados pequenas peças hexagonais ("plugs") que podem ser removidas contemplando a topografia da lesão plantar.
Durante evento da Wound Healing Society nos EEUU fomos informados de que o produto ainda não está disponível no Brasil.



Mudando apenas o formato dos "plugs" a empresa italiana BONAPEDA oferece essa palmilha denominada FORS -15 Off-Loading Insole.

Analisando a amostra que trouxemos do EWMA 2017 (Amsterdam) verificamos que há um reforço na forração da palmilha conferindo-lhe maior durabilidade.
A exemplo da anterior, o produto não está disponível para aquisição no Brasil.






Portanto, nossa conduta não representa ineditismo.
Representa, sim, um esforço para oferecer aos nossos pacientes uma alternativa ao seu alcance.

Como fazemos? 


Imagem 1
1. (Imagem 1) - Desenhar o molde do pé afetado
em folha de papel, marcando a topografia
 da ferida ou das feridas.


2. Transferir para a palmilha a marcação da folha de papel. (Imagens 2 e 3)
A palmilha é a sandália do paciente, sem as tiras. Regra geral trata-se da popularmente chamada sandália "japonesa" ou "havaiana".

Imagem 2
Imagem 3





















3. Recortar na palmilha a área correspondente à projeção da ferida e aos pontos de pressão de seu entorno. (Imagem 4 e 5)

                                                                                                                  
Imagem 4
Imagem 5





















4. Para evitar que a ferida fique "flutuando" na área recortada precisamos forrar a palmilha com lâmina de material apropriado (plastico, IVA, couro, etc); sem este cuidado, no processo de granulação, o leito da ferida poderá hipertrofiar para o interior do espaço vazio; nesta fase até mesmo as bandagens, compressivas ou não, secundárias ao curativo (bota de UNNA, ataduras, hidrocolóide, etc) poderão evitar esse fenômeno indesejado. (Imagem 6 e 7)


Imagem 6

Imagem 7





















5. Em muitos casos, essa palmilha, depois de pronta, pode ser fixada com fitas colantes de dupla face no assoalho do calçado usado pelo paciente para evitar seu deslocamento durante a marcha. Para isto damos preferências às sandálias que se fixam aos pés com tiras de velcro, de modo a abraçar confortavelmente a palmilha e o pé.

Importante salientar que a confecção desses modelos é um exercício permanente de adaptação e correção. Daí a necessidade de avaliações sequencias ao longo do tempo.
Os pés dos pacientes diabéticos sempre apresentam surpresas que necessitam de olhar constante.


segunda-feira, 15 de maio de 2017

IODOSORB CREME

Durante muitos anos – eu diria, décadas – usamos produtos com Iodo para limpeza, assepsia e antissepsia da pele.

Nos centros cirúrgicos o álcool iodado e depois o Povidine – nas versões alcoólica e degermante – faziam parte da rotina de preparo das mãos da equipe cirúrgica e do campo operatório em muitos centros cirúrgicos. Era um problema quando pacientes informavam alergia ao Iodo em serviços que não dispunham de outras alternativas.

Se, por um lado, os iodados foram abandonados nos centro cirúrgicos,, os compostos de iodo tópico vem se impondo como alternativa contra a infecção no tratamento das feridas crônicas. Concentrações apropriadas contornam a toxicidade celular dos produtos convencionais.


Comentaremos um pouco de nossa experiência com o IODOSORB da empresa Smith&Nephew.

Informamos que não temos qualquer conflito de interesse relacionado ao produto.

Trata-se de uma pomada formada por microesferas de amido – quimicamente, um cadexómero – acrescida de iodo a 0,9%. 
Enquanto o composto de amido atua como absorvente do exsudato, o iodo vai sendo gradualmente liberado para o ambiente da ferida e exercendo suas atividades bactericidas e bacteriostáticas.

Figura 1


A figura 1 mostra o aspecto por ocasião da colocação do IODOSORB sobre leito infectado.




Figura 2



Na figura 2 podemos observar o aspecto gelificado do IODOSORB após 48 horas. É possível ver ainda, por transparência, sinais de infecção ainda ativa no leito.




O aspecto após uma semana de aplicação do IODOSORB (Figura 3).
Por sob a cobertura não aderente o leito se mostra livre de infecção visível e com boa granulação.

Figura 3
Em nossa experiência estamos bem impressionados com a eficiência do produto.

Uma de suas vantagens é que pode ser aplicado sob terapia compressiva tais como Bandagens de UNNA. Para nós isto é muito importante pois a grande maioria dos pacientes necessitam de terapia compressiva para combate ao edema e ao exsudato.




Considerações importantes


  • Segundo o fabricante o amplo espectro da atividade  antibacteriana dura em torno de 72 horas.
  • É muito fácil de retirar pois não adere ao leito  e adquire coloração esbranquiçada com aspecto gelatinoso.
  • Pode ser facilmente aplicado em feridas com leito cavitário, o que torna a sua aplicação muito conveniente para determinadas úlcerações do pé diabético.
  • Convém evitar transbordamento do produto para a pele do entorno; o fabricante recomenda que não se ultrapasse 50g em uma única aplicação (as bisnagas que usamos em nosso serviço contem 20g).
  • O IODOSORB está contraindicado em pacientes com distúrbios da tireóide, gestantes e lactantes.

Sugestão de leitura:
  • Cadexomer iodine provides superior efficacy against bacterial wound biofilms in vitro and in vivo -Autores: Daniel J. Fitzgerald PhD,Paul J. Renick MS,Emma C. Forrest BS,Shannon P. Tetens BS,David N. Earnest BS,Jillian McMillan BS,Brett M. Kiedaisch MS,Lei Shi PhD,Eric D. Roche PhD

sábado, 22 de abril de 2017

Mal perfurante plantar em pé diabético neuropático

O mal perfurante plantar ou úlcera plantar em pé diabético neuropático está entre os grandes desafios nos serviços dedicados ao tratamento das feridas crônicas.

Vamos considerar aqui o pé diabético neuropático puro, ou seja, aquele em que não há comprometimento significativo da circulação arterial; os pulsos estão presentes e de boa qualidade, tanto o Dorsal do pé quanto o Tibial Posterior, o ITB (Índice Tornozelo/Braço) é maior do que 0,7 e a pressão sistólica do membro afetado está acima de 80 mmHg.

Os diabéticos com neuropatia avançada perdem a sensibilidade cutânea e não sentem dor quando seus pés são submetidos aos micro-traumas repetidos e constantes provocados por calçados inapropriados, pelo simples ato de caminhar ou outros mecanismos que possam provocar danos às estruturas anatômicas dessa região, especialmente à pele (isso faz parte da perda da capacidade proprioceptiva).

Por outro lado e além da perda da sensibilidade protetora, a neuropatia predispõe a alterações da arquitetura óssea do pé e de suas articulações, resultando em deformidades que alteram ainda mais os pontos de pressão e a normalidade da marcha.

Daí decorrem a formação de calosidades nos pontos de atrito e cisalhamento que, com o tempo e a persistência da "agressão" acabam resultando na formação das feridas ou ulcerações. Essas feridas são precursoras da amputação, especialmente quando se tornam infectadas.

Quando as feridas se localizam em topografia plantar a evolução para a cicatrização se torna mais complexa: o paciente, ao deambular, estará pisando sobre a ferida e perpetuando o trauma.

Daí à infecção que pode migrar para planos mais profundos - fáscias, tendões e ossos - é um passo.

O risco de agravamento com perda de tecidos e de planos ósseos se torna dramática e pode evoluir negativamente para amputação de segmentos menores ou mais extensos.

A estatística mundial dessa realidade é alarmante.

DISPOSITIVOS DE CONTATO TOTAL

Para a cicatrização dessas feridas algumas providências podem ser tomadas.

Todas visam a eliminação da pressão sobre o leito da ferida. Entre elas:

1. Repouso absoluto até a cicatrização
2. Locomoção em cadeiras de rodas com o pé protegido
3. Uso de moletas ou "andadores"que permitam não pisar com o pé comprometido

As soluções acima praticamente retiram o paciente de suas atividades laborativas e sociais,fazendo com que sua adesão ao tratamento seja mínima.

O que são os dispositivos de contato total ?

O que se procura obter com a aplicação dos dispositivos ditos de contato total é uma distribuição homogênia da carga sobre o pé afetado ao deambular - em inglês off-loading (descarga).

O que acontece ao usar esse dispositivo:
  • o peso do corpo, ao andar, é transferido significativamente para a panturrilha
  • reduz as forças de pressão e cisalhamento na face plantar do pé
  • a estabilização do ângulo do tornozelo em 90% (ao aplicar o dispositivo) reduz as fases de impacto e propulsão da marcha e a pressão sobre a ferida


Ao ficar em pé e caminhar, duas forças são aplicadas na região plantar dos pés: a pressão exercida pelo peso do seu corpo sobre o solo (setas em vermelho na imagem) e o cisalhamento horizontal decorrente do impacto e da propulsão no ato de andar ou correr (setas em azul na imagem).

Num pé em condições normais nada acontece.

Entretanto, no pé diabético neuropático onde já se instalaram algumas alterações na arquitetura óssea, promovendo pequenas ou severas deformidades (tais como no pé de Charcot), aquelas forças de pressão e cisalhamento vão provocar danos.







As deformidades neuropáticas e a perda da sensibilidade farão com que o ato de caminhar produza traumas repetidos que vão se transformar em feridas nos pontos irregulares de pressão, como
Imagem 1
mostrado nas imagens 1  e 2.

Os sistemas de contato total procuram neutralizar ou minimizar esses microtraumas repetidos, permitindo que os eventos celulares e extracelulares do processo de cicatrização possam prosseguir.

Imagem 2

Os dispositivos devem adquirir, na perna,  o formato de um funil com o seu diâmetro menor na região maleolar e se alargando na medida em que vai se moldando ao formato da panturrilha.

Por esta razão é importante que o profissional esteja treinado e familiarizado com a técnica de aplicação dos dispositivos, tanto os de fibra de vidro como os de gesso ou outro material sintético.


Imagem 3

Após a aplicação do dispositivo de contato total o peso do corpo é distribuído de forma uniforme sobre a região plantar. Além disso o formato da "bota" distribui esse peso para a panturrilha.

No desenho gráfico da imagem 3 as setas mostram de que forma o peso é transferido para a ancoragem do dispositivo na panturrilha.

Ferida mostrada na Imagem 1 cicatrizada após 5 semanas de aplicação da TCC-EZ sobre a qual pretendo brevemente apresentar algumas considerações. 







quinta-feira, 23 de junho de 2016

PICO - Terapia por Pressão Negativa

A cada momento surgem novos modelos de dispositivos baseados na tecnologia por pressão negativa focados no tratamento das feridas crônicas de difícil cicatrização.
Alguns desses modelos são formatados para utilização em ambiente hospitalar, exigindo assim a manutenção dos pacientes em regime de internação. Em alguns casos essa é a alternativa possível.
Entretanto, a evolução para a portabilidade dos novos equipamentos permitem que quantidade expressiva de pacientes possa ser desospitalizada sob acompanhamento em regime ambulatorial ou domiciliar. Vislumbra-se aí o significativo impacto na redução dos custos desse procedimento.
A Terapia por Pressão Negativa no tratamento das feridas já está consistentemente demonstrada por seus efeitos benéficos no processo de cicatrização, pela:

  •  criação de ambiente úmido, 
  • drenagem de exsudatos excessivos, 
  • redução do edema tecidual, 
  • limpeza antibacteriana do leito, 
  • aceleração da formação de tecido granulado ricamente vascularizado e 
  • aproximação dos bordos das feridas
Riquíssima literatura está disponível para quem deseja se esmerar no conhecimento dessa tecnologia.
Nessa postagem vamos nos deter em um dispositivo de terapia por pressão negativa muito específico por usas características "minimalistas": o PICO
Trata-se de um "dispositivo ultraportátil, de utilização única e extremamente simples".


  • O PICO não possui reservatório em separado. O reservatório é a própria cobertura. Donde se infere que não deve ser indicado para feridas muito extensas ou feridas com exsudato muito abundante, o que poderia exaurir a sua capacidade de absorção.
  • Funciona com duas baterias AA
  • Dependendo das características da ferida pode permanecer por até 7 dias
  • Manuseio muito fácil e prático para o paciente.
  • Dotado de uma pequena bomba com pressão fixa de -80mmHg
  • O curativo está conectado a esta bomba e é formatado em quatro camadas:
  1. camada de contato e adesivo de silicone que assegura a fixação e minimiza traumas ao aplicar e remover.
  2. Camada de ar - "Airlock" - que distribui a pressão negativa
  3. Uma camada absorvente
  4. Filme com alta taxa de transmissão de vapores úmidos

Figura 1 - Exemplo de ferida em coto de amputação de pé diabético. Aspecto estacionado da evolução apesar dos curativos com alginato e compressão contra edema.









Figura 2 - Aplicação do curativo e sua fixação evitando qualquer ponto de vazamento. Observe-se a posição de saída do tubo de conexão com a bomba, distante do leito da ferida. 

Figura 3 - Aspecto após 07 dias da aplicação. Observa-se a eficiência da pressão negativa pelo colabamento da cobertura sobre a área. Pequena quantidade de exsudato retido no interior da camada absorvente.








Figura 4 - Não foi necessário descontinuar a terapia compressiva que já vinha sendo aplicada em virtude do edema da insuficiência venosa crônica concomitante apresentada pelo paciente.






Figura 5 - Resultado após a primeira semana de tratamento.




Podemos concluir que a Terapia por Pressão Negativa das feridas crônicas representa um ganho extraordinário para a resolutividade na cicatrização. Cabe ao profissional selecionar criteriosamente cada caso e escolher o dispositivo mais apropriado que se mostre adequado para cada situação.